sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

A IMACULADA CONCEIÇÃO E A HISTÓRIA DE PORTUGAL: DA CONQUISTA DE LISBOA À ATUALIDADE


Inmaculada Concepción (1682), por Murillo


A Imaculada Conceição (ou Imaculada Concepção) é um dogma da Igreja Católica que afirma que a Virgem Maria foi preservada do pecado original desde o momento da sua concepção, instituído por Pio IX a 8 de Dezembro de 1854, através da bula Ineffabilis Deus. O seu culto tem origem no cristianismo oriental e chega à Europa pelas mãos dos cruzados nos séculos XI e XII. A Nossa Senhora da Conceição é rainha e padroeira de Portugal, bem como de todos os povos de língua portuguesa. A sua festa celebra-se hoje, 8 de Dezembro, e até já foi Dia da Mãe em Portugal, continuando a maternidade a ser homenageada neste dia em vários países ibero-americanos.


Porquê é que se diz que a Imaculada Conceição é rainha de Portugal? Isto deve-se ao gesto do primeiro rei da quarta dinastia, D. João IV de Bragança, que em ação de graças pelo sucesso da Restauração da Independência em 1640, coroou a imagem de Nossa Senhora da Conceição da Igreja de Santa Maria do Castelo (Vila Viçosa) como rainha de Portugal. O gesto tornou-se uma promessa solene respeitada por todos os monarcas brigantinos até à implantação da república, que não voltariam a usar a coroa nas suas cabeças, sendo esta colocado sobre uma almofada ao seu lado direito em ocasiões solenes.

Mas a relação do culto imaculista com a nação portuguesa é muito mais antiga, remetendo às origens da própria nacionalidade. Segundo a tradição, o fundador D. Afonso Henriques realizou uma missa pontificial de ação de graças dedicado à Imaculada Conceição, logo após a Conquista de Lisboa, em Outubro de 1147. Em Portugal, a evocação desta santidade transcende muito a questão religiosa, sendo o 8 de Dezembro o prolongamento natural do 1 de Dezembro e portanto uma comemoração da própria nação portuguesa e da sua soberania.




Visão de Afonso Henriques na Batalha de Ourique (1665), por Frei Manuel dos Reis


Para a dinastia entronizada pelo golpe de estado revolucionário de 1 de Dezembro de 1640, o simbolismo da Conceição adquire contornos fundacionais por si, pela sua ligação ao Condestável D. Nuno Álvares Pereira, fundador simbólico do ducado que teve origem na união da sua filha única Dona Brites Pereira com Afonso de Portugal, filho bastardo do rei D. João I. É dito no seguimento da Batalha de Aljubarrota, D. Nuno Álvares Pereira fundou a Igreja de Nossa Senhora do Castelo em Vila Viçosa e ofereceu a imagem da Virgem Padroeira, adquirida em Inglaterra.

A intenção de tornar a Imaculada Conceição padroeira de Portugal ficou demonstrada logo no 8 de Dezembro de 1640, quando o Frei João de S. Bernardino, ao pregar na capela Real de Lisboa na presença do Duque de Bragança, agora já Rei de Portugal, termina o sermão com a promessa: “Seja assi, Senhora, seja assi; e eu vos prometo, em nome de todo este Reyno, que elle agradecido levante um tropheo a Vossa Immaculada Conceição, que vencendo os seculos, seja eterno monumento da Restauração de Portugal, Fiat, fiat”.

A oficialização do patronato chegaria nas cortes de 25 de Março de 1646, com D. João IV a proclamar, “tomar por padroeira de nossos Reinos e Senhorios a Santissima Virgem Nossa Senhora da Comseição . . . confessare deffender May de Deus foi concebida sem pecado original”. Por esta proclamação a Virgem Imaculada era constituída Senhora e Rainha de Portugal, a verdadeira soberana da nação portuguesa, na presença dos três Estados do reino reunidos.

Este mesmo monarca, em 1648, mandou cunhar moedas de ouro e de prata chamadas Conceição, com a seguinte legenda: no anverso Joannes IIII, D. G. Portugaliae et Algarbiae Rex, a cruz da Ordem de Cristo, e no centro as armas de Portugal. No reverso a imagem de Nossa Senhora da Conceição, sobre o globo e a meia-lua, com data de 1648, e nos lados o sol, o espelho, o horto, a casa de ouro, a fonte selada e a arca do santuário e a legenda TVTELARIS REGNI.




Vitrais da Basílica de Nossa Senhora do Sameiro (1961), por Martins Barata


A 30 de Junho de 1654, o referido monarca, enviou a todas as Câmaras cópia da inscrição latina comemorativa do juramento solene feito em 25 de Março de 1646 e para que fosse mais notória a obrigação de defender “que a Virgem Senhora Nossa foi concebida sem pecado original” ordenou que aquela inscrição fosse gravada em pedra e colocada nas portas e lugares públicos das cidades e vilas do reino.

Também neste mesmo ano de 1654 o reitor, lentes, doutores e mestres da Universidade de Coimbra, reuniram-se e determinaram que a fórmula do juramento de todos os futuros graduados começasse pela declaração de "defender sempre e em toda a parte que a Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus, foi concebida sem a mancha do pecado original". Até 1910 o cumprimento de tal juramento era condição para se obter qualquer grau universitário.

Por Decreto de 20 de Junho de 1696, o Príncipe Regente D. Pedro, futuro D. Pedro II, aprovou a Confraria dos Escravos de Nossa Senhora da Conceição, cuja missão era promover e incutir nos membros uma especial devoção a Nossa Senhora da Conceição. Também o seu sucessor, D. João V, a 12 de Dezembro de 1717, em circular enviada à Universidade de Coimbra e a todos os prelados e colegiais do reino, recomendava-lhes que todos os anos celebrassem nas suas igrejas a festa da Imaculada Conceição, recordando o juramento de D. João IV.

Após a proclamação dogmática em 1854 surgiu em Portugal um movimento no sentido de erguer um monumento nacional em homenagem da Imaculada Conceição. Em 1869 concluiu-se esse primeiro monumento no cume de uma montanha em Braga, seguindo-se-lhe a construção do Santuário de Nossa Senhora do Sameiro. Em 1904, a figura da Nossa Senhora do Sameiro seria solenemente coroada pelo Núncio Apostólico José Macchi, delegado enviado por Pio X, em imitação do ato de D. João IV em 1646.


Consultas bibliográficas:

https://www.snpcultura.org/imaculada_conceicao_e_historia_portugal.html
https://risco-continuo.blogs.sapo.pt/564773.html


Luís Alves Carpinteiro | Cabo Não


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