Alegoria à Academia Real da História (1735), por Francisco Vieira Lusitano |
A 8 de dezembro de 1720, no dia da Imaculada Conceição, era fundada por decreto de D. João V a Academia Real da História Portuguesa, com o objetivo de “escrever a História de Portugal e de suas Conquistas”. Foi adotada como divisa a frase latina Restituet omnia, onde se afirmava a vocação de restaurar toda a memória e reunir todos os documentos, com o propósito de redigir pelos métodos modernos a História Eclesiástica e Secular de Portugal e dos seus domínios ultramarinos.
Esta missão foi depositada nos 50 sócios que compunham a Real Academia: “40 da Academia de Anónimos e das Conferências Discretas e 10 escolhidos pelo Rei”. Entre os seus académicos notáveis encontravam-se D. Manuel Caetano de Sousa, os marqueses de Abrantes, de Alegrete, de Fronteira, de Valença, o conde da Ericeira, D. António Caetano de Sousa, Manuel Teles da Silva, Diogo Barbosa Machado, Alexandre Ferreira, Jerónimo Contador Argote, Raphael Bluteau ou o Padre António dos Reis.
A sua génese insere-se num Iluminismo incipiente manifestado no reinado de D. João V e deveu-se em parte à ação política de dois dos seus principais impulsionadores, D. António Caetano de Sousa e Francisco Xavier de Meneses, conde da Ericeira. É sucessora de diversos cenáculos e tertúlias em campos díspares como as letras, as ciências, a filosofia e as artes (as chamadas Academias Menores) que proliferam em Lisboa desde meados do século XVII: Academia dos Generosos (1647), Academia Portuguesa (1696), Academia da História Eclesiástica (1715), Academia dos Ilustrados (1716), Academia dos Anónimos (1717) e Academia dos Retóricos (1720).
A Academia Real da História vai agregar alguns dos membros das Academias Menores cuja experiência tinha despertado o interesse para a atividade historiográfica (notavelmente a Academia Portuguesa e a Academia da História Eclesiástica) e assumir um carácter pioneiro no contexto europeu, antecedendo em 18 anos a sua homóloga espanhola, decretada a 18 de abril de 1738 pelo rei Filipe V.
D. António Caetano de Sousa (1674-1759) |
A Academia reunia de quinze em quinze dias no Paço dos Duques de Bragança para a "leitura das Memórias e dos Catálogos de nomes ilustres". Os seus trabalhos decorreram com invulgar liberdade para a época, tendo o Decreto de 29 de abril de 1722 isentado as suas publicações de censura prévia do Desembargo do Paço, ficando apenas sujeitas à supervisão de quatro censores privados. Em 1727, é lançado a História da Academia Real da História Portuguesa, pelo marquês de Alegrete.
O seu legado é composto por um corpus de 15 volumes (Coleção dos documentos e memórias, publicada anualmente entre 1721 e 1736) e as obras dos seus sócios, entre as quais se destacam a História Genealógica da Casa Real Portuguesa, de D. António Caetano de Sousa, e as respetivas Provas (1735-1748); Memórias sobre D. Sebastião, de Diogo Barbosa Machado (1736-1751); Biblioteca Lusitana, de Diogo Barbosa Machado (1741-1759); Notícias Cronológicas da Universidade de Coimbra, de Francisco Leitão Ferreira (1729); Memórias para a História Eclesiástica do Arcebispado de Braga, de D. Jerónimo Contador de Argote (1732-1747).
História Genealógica da Casa Real Portuguesa (folha de rosto) |
A análise da Coleção dos documentos e memórias permite-nos obter preciosas pistas de como decorriam os labores científicos. Segundo Humberto Baquero Moreno "a grande preocupação dos membros da Academia consistiu na recolha de materiais que permitissem edificar uma história religiosa e secular de Portugal". O poder legislativo do monarca acompanhou e deu ampla cobertura aos académicos com medidas que podem ser consideradas percursoras dos planos de salvaguarda modernos, como a proteção de "papéis, medalhas, restos arqueológicos e outros materiais cuja utilidade era evidente" e a proibição da destruição de "estátuas, mármores e cipos" e ainda "medalhas e moedas antigas que perdurassem até ao reinado de D. Sebastião".
A decadência desta instituição foi, todavia, paulatina mas inexorável, cessando-se a publicação das suas coleções logo em 1736. A crise foi exacerbada pelo Terramoto de Lisboa de 1755 que provocou a derrocada do Paço dos Duques de Bragança e com ela a perda de parte importante do acervo documental. De acordo com Baquero Moreno, o Pombalismo foi "adverso à sua existência" por ver nestes movimentos da nobreza culta um obstáculo à política centralizadora.
A anunciada extinção ocorre, por falta de atividade, por volta de 1776, sendo também atribuída às “desavenças que desde o início dividiram os académicos” ou à “criação da Academia Real das Ciências”. De modo a preencher o vácuo deixado pela ausência de estudos históricos o rei D. José criou a cadeira de Diplomática, a qual "tinha em vista o conhecimento interpretativo dos conhecimentos atinentes à História de Portugal", e chegaria à Universidade de Coimbra no reinado seguinte, pela mão de D. Maria I. Em 1936, no âmbito das celebrações dos 10 anos do Estado Novo, dá-se a fundação da Academia Portuguesa de História, que se assume como sua sucessora e se encontra sediada no Palácio dos Lilases, na Alameda das Linhas de Torres, em Lisboa.
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