sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

COMO BISMARCK UNIFICOU A ALEMANHA



Personificação da Germânia (1848, atribuído a Philipp Veit)

No final do século XVIII a Europa Central estava fragmentada em cerca de 300 estados independentes de dimensão e sistemas políticos variáveis entre reinos, ducados, principados e cidades-livres. Estes estados estavam vagamente unidos debaixo da anacrónica denominação de Sacro Império Romano, originária da era de Carlos Magno.


Durante a segunda metade do século XVIII a relação entre estados germânicos foi dominado pela rivalidade entre o Reino da Áustria dos Habsburgo e o Reino da Prússia dos Hohenzollerns. Tradicionalmente, a Áustria era o estado dominante e os arquiduques Habsburgo assumiam o título de Imperadores Romano-Germânicos. O balanço de poderes entre os dois estados sofreu alterações a partir de 1740 com o aumento do poderio militar e aquisição de novos territórios pela Prússia.

No contexto das Guerras Napoleónicas o Sacro Império Romano é dissolvido, tornando a Europa Central um dos principais pontos de discussão no Congresso de Viena (1814-15). A solução encontrada foi a formação da Confederação Germânica, composta por 39 estados. A Confederação teve sucesso enquanto unidade militar, com cada um dos estados a comprometer-se a defender os outros em caso de ataque externo, no entanto falhou em termos económicos e como órgão de unidade nacional.

A primeira forma de união económica foi gizada em 1834 com o estabelecimento a aliança aduaneira Zollverein. O debate sobre a unificação da Alemanha era à época um confronto entre duas ideias: uma "Pequena Alemanha" que excluía a Áustria e uma "Grande Alemanha" que incluía a Áustria. Os apoiantes da "Pequena Alemanha" alegavam que a composição étnica da Áustria, com cerca de 15 minorias distintas, dificultaria a gestão do território.

O primeiro esforço sério de unificar a Alemanha ocorreu durante o ano de 1848 quando a Revolução de Fevereiro em Paris acirrou os ímpetos nacionalistas germânicos. No dia 18 de Maio a primeira Assembleia Nacional eleita pelo povo alemão reunia-se em Frankfurt. Todavia, a experiência foi gorada pela debilidade do poder executivo e terminou no Outono de 1849.


A CHEGADA DO CHANCELER DE FERRO


"Cedo me verei compelido a assumir a condução da governação prussiana... Tão cedo o exército seja devolvido a tais condições que imponham respeito, aproveitarei o primeiro pretexto válido para declarar guerra à Áustria, dissolver a Confederação Germânica, subjugar os estados menores e proceder à unificação da Alemanha sob liderança da Prússia" Otto von Bismarck, 1862.

Otto von Bismarck. Fotografias coloridas digitalmente por www.jecinci.com

A suprema motivação do Príncipe de Bismarck, como a de qualquer junker, era preservar a antiga Prússia real, militarista e autocrática. Todavia, tinha noção que a vaga de nacionalismo liberal que criava novos Estados-Nação por toda a Europa podia ser canalizada mas nunca parada.

A Alemanha de Bismarck teria a aparência de uma união nacional mas serviria o propósito de assertar o domínio prussiano entre os povos germânicos. Bismarck esperava que por esta altura o ímpeto unificador dos nacionalistas alemães fosse tão grande que nem reparassem no facto de estarem perante uma tomada de poder prussiana.

A unificação alemã foi imposta por Bismarck "de cima para baixo" através de um exímio calculismo político que envolveu uso de propaganda que apresentava a Prússia como baluarte do pangermanismo em direta oposição ao liberalismo anglófilo dos estados ocidentais.  

Em 1864, uma primeira guerra de unificação é combatida quando uma coligação entre a Prússia e a Áustria sai em defesa do ducado da Holsácia, em perigo de anexação pela Dinamarca, aliada da Grã-Bretanha. Serve esta guerra o propósito de separar as águas entre germânicos nacionalistas e anglófilos que doravante apoiarão a causa de Bismarck.

Em 1866, era a vez de prussianos e austríacos medirem forças e resolviam para sempre a questão da "Pequena Alemanha" versus "Grande Alemanha". O confronto durou poucas semanas e resultou na anexação pela Prússia de estados que tinham alinhado com a Áustria, como Hannover e Nassau. A Prússia vai permitir a manutenção da independência de alguns dos maiores estados aliados da Áustria, nomeadamente Baden e a Baviera.

Em 1867, Bismarck funda a Confederação Germânica do Norte, uma união dos estados do norte sob a hegemonia da Prússia. Vários estados vão aderir a esta entidade que servirá de molde para o futuro Império Alemão. A terceira e última fase do processo de unificação decorreu da Guerra Franco-Prussiana (1870-71), engendrada por Bismarck como forma de coagir os estados ocidentais mais expostos à arremetida francesa a aderir à Confederação Germânica do Norte.


Estátua de Bismarck em Hamburgo

A vitória prussiana seria total com o Segundo Império francês a ser derrotado perante um exército mais numeroso e tecnologicamente avançado. A campanha vitoriosa culminaria com a queda de Paris a 28 de janeiro de 1871 e com a anexação prussiana das províncias francesas de Alsácia e Lorena, formalizada pelo Tratado de Frankfurt a 10 de maio de 1871. O irredentismo da Alsácia-Lorena permanecerá uma pedra no sapato das relações franco-germânicas e estará na origem de confrontos entre os dois países na Primeira e Segunda Guerra Mundial.

No rescaldo da derrota francesa, o Império Alemão é proclamado no Salão dos Espelhos do Palácio de Versalhes, convertendo a Confederação Germânica num Império e o rei da Prússia, Guilherme I, no seu imperador. A Alemanha unificada aglomerará um total de 26 estados, deixando de parte a Áustria. Ao longo das décadas seguintes a Alemanha tornou-se um gigante industrial, tecnológico e científico, amealhando mais prémios Nobel do que qualquer outra nação. No dealbar do século XX já era a maior economia da Europa, ultrapassando a Grã-Bretanha, e a segunda maior do mundo, ficando apenas atrás dos Estados Unidos.



LAC

1 comentário:

  1. Fiquei com a impressão que o afastamento de Bismarck conduziu ao desastre. Não apenas a questão da Alsácia-Lorena. Nos textos franceses do secundário, após a derrota militar, o assunto mobilizava França à guerra, mas Guilherme I e Bismarck foram uma dupla formidável.

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