segunda-feira, 16 de julho de 2018

DA REVOLUÇÃO À CONSOLIDAÇÃO DEMOCRÁTICA (1974-1976): PARTE I



Militar remove retrato na sede da PIDE (Eduardo Gageiro).

Após mais de quatro décadas de existência o regime autoritário do Estado Novo é deposto por um movimento de jovens oficiais do Exército Português. O percurso final do Salazarismo (1968-1974) caracteriza-se pelo arrastar de uma guerra de contra-insurgência travada nas colónias africanas, uma crise financeira no início da década de 70, desavenças internas dentro do regime e o recrudescer de descontentamentos em diversos sectores da sociedade.

Umas forças armadas desgastadas com um conflito bélico sem fim à vista, afronta-se com o decreto-lei nº 353/73 que facilitava aos oficiais contratados pelo Exército o acesso aos quadros permanentes mediante um curso intensivo na Academia Militar. Este acto justificado pela escassez de oficiais na frente de guerra foi contestado pelos oficiais de carreira que viam as suas promoções sucessivamente adiadas.

Decididos a pôr fim ao "estado a que isto chegou" o Movimento das Forças Armadas (MFA) inicia operações, planeadas e lideradas pelo Comandante Otelo Saraiva de Carvalho, tomando diversas posições estratégicas em Lisboa. Na madrugada do dia 25 de Abril de 1974 o Marcello Caetano é capturado no Quartel do Carmo, onde se refugiara, acedendo render-se mediante a entrega do poder ao General António de Spínola para que "o poder não caia na rua"; o Presidente da República Américo Thomaz é igualmente aprisionado e mandado para o exílio no Brasil, destino que irá partilhar com Caetano.


Momento de tensão na Rua do Arsenal com Salgueiro Maia em primeiro plano (Alfredo Cunha).

Após a euforia inicial e alguns incidentes entre a população e agentes da PIDE/DGS, procede-se à libertação dos presos políticos das prisões de Peniche e Caxias no dia 26 de Abril. Para sustentar o recém-criado estado democrático forma-se a Junta de Salvação Nacional, liderada pelo Presidente António de Spínola, cuja composição era integralmente militar. Este novo corpo governativo depara-se com o desafio de pôr termo ao conflito ultramarino e conter as exaltações sociais que se começavam a evidenciar.

Proclamação da Junta de Salvação Nacional (26 de Abril de 1974).

É neste clima tenso que toma posse o I Governo Provisório, liderado pelo Professor Adelino de Palma Carlos. Esta solução vai alcançar um fim abrupto com a queda do governo em 11 de Julho de 1974 com a demissão de Palma Carlos. Será sucedido pelo Coronel Vasco Gonçalves que forma o II Governo Provisório.

O Presidente Spínola demarca-se do MFA na questão da descolonização, privilegiando a solução federalista que propusera em "Portugal e o Futuro". Esta é a primeira fractura no seio do movimento revolucionário. O general tentará manter as rédeas do poder apelando à "maioria silenciosa", na esperança de incitar uma demonstração de força por parte dos sectores mais conservadores da sociedade.

Uma manifestação de apoio a Spínola agendada para 28 de Setembro é cancelada e o General tenta declarar o estado de sítio, pedido que lhe é no entanto recusado. A população lisboeta ergue barricadas e paira o medo de um golpe conservador. Na sequência do incidente o General Spínola vai-se demitir ocasionando a queda do II Governo Provisório.

O General Costa Gomes toma posse como Presidente da República e Vasco Gonçalves é novamente convidado a liderar o III Governo Provisório. Este novo corpo governativo utilizará o COPCON de Otelo de Saraiva de Carvalho para se manter no poder e sufocar a oposição. É durante este período que uma constelação de partidos e pequenos movimentos começam a ter uma participação mais activa sendo de destacar o Partido Socialista de Mário Soares, o Partido Comunista de Álvaro Cunhal e o Partido Popular Democrata de Sá Carneiro.

A sociedade portuguesa é acometida por uma agitação potencialmente explosiva propulsionada pelas clivagens políticas entre as massas radicalizadas à esquerda ou à direita. Com o General Spínola refugiado em Espanha e as vozes extremadas nas ruas receia-se um ataque ao poder que parece estar eminente. Estavam formadas as condições para o Verão Quente de 1975.



Francisco Alexandre Caldas

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