domingo, 10 de junho de 2018

O REPUBLICANISMO PORTUGUÊS

Alegoria à República e as principais figuras do republicanismo (Roque Gameiro, 1909) 

As primeiras manifestações de republicanismo em Portugal remetem genericamente a certas correntes do Setembrismo (a partir de 1836) e à Guerra Civil da Patuleia (1846-47). O republicanismo é matricialmente inspirado tanto em Portugal como no contexto europeu pelo jacobinismo da Revolução Francesa de 1789.

É porém sobretudo a partir da década de 1880 que vai adquirir a expressão de “grande movimento”. O Partido Republicano Português é fundado em 1876 e dois anos depois Rodrigues de Freitas torna-se o primeiro deputado republicano a ser eleito. Assumem-se como veiculadores do progresso, ferozmente opostos ao “obscurantismo” e ao “ultramontanismo” corporizado pela monarquia e pelo clero.

Apesar da sua fraqueza relativa inicial vão habilmente tecer uma eficiente máquina de propaganda que associa o republicanismo ao patriotismo, atingindo um dos seus expoentes nas celebrações camonianas de 1880. Encontram igualmente importantes plataformas de divulgação do ideário republicano na nova imprensa afecta à causa como "O Século" de Sebastião de Magalhães Lima, publicado pela primeira vez em Janeiro de 1881.  

Vão capitalizar politicamente o Ultimato britânico (1890) assumindo-se como defensores dos interesses nacionais e acusando de “cobardia” o recém entronizado Dom Carlos. Sucede-se a primeira tentativa de tomada do poder no fim de Janeiro de 1891 quando Alves da Veiga chega a proclamar a República e a nomear um “Governo Provisório” a partir da varanda da Câmara Municipal do Porto. Porém em menos de duas horas a Guarda Municipal domina a sublevação e os confrontos saldam-se com uma dezena de mortos do lado dos revoltosos.

No virar do século a estabilidade governativa é mantida segundo um sistema de rotativismo político, alternando entre os Regeneradores de Hintze Ribeiro e os Progressistas de Luciano de Castro. O desgaste deste sistema vai levar Dom Carlos a apontar João Franco para formar governo, cuja maioria parlamentar será salvaguardada pelo apoio de Luciano de Castro do Partido Progressista. Quando o Partido Progressista retira o apoio a João Franco o rei vai atribuir plenos poderes ao seu ministro para governar por decreto, suscitando acusações de "absolutismo" por parte da oposição.


Populares montam barricadas na Praça Marquês de Pombal (4/10/1910, Arquivo DN)

Recrudesce a contestação ao governo e ao próprio rei à medida que populares incitados pelos partidos começam a apupar a família real nas suas viagens. O Teatro do Príncipe Real põe em cena "Ó da Guarda", uma peça anti-franquista. No dia 28 de Janeiro de 1908 é descoberta uma conjura levada a cabo por grupos paramaçónicos para assassinar João Franco. É a "intentona do elevador da biblioteca" na sequência da qual são encarcerados cerca de uma centena de conspiradores, entre os quais Afonso Costa.

No dia 1 de Fevereiro quando a família real retornava de Vila Viçosa um grupo de conspiradores que escapara à prisão dispara vários tiros sobre a carruagem onde seguiam, ferindo mortalmente o rei Dom Carlos e o príncipe real Dom Luís Filipe. O infante Dom Manuel com apenas 18 anos vai subir ao trono tomando como primeira decisão a demissão do governo de João Franco.


"Vi um homem de barba preta (...) abrir a capa e tirar uma carabina (...). Quando (o) vi (...) apontar sobre a carruagem percebi bem, infelizmente, o que era. Meu Deus, que horror o que então se passou! Logo depois do Buíça ter feito fogo (...) começou uma perfeita fuzilada, como numa batida às feras! Aquele Terreiro do Paço estava deserto, nenhuma providência! Isso é que me custa mais a perdoar ao João Franco..." Dom Manuel II

A nomeação do governo de "acalmação" chefiado pelo almirante Ferreira do Amaral vai serenar temporariamente os ânimos mas sentenciar a já moribunda monarquia deixando o jovem rei rodeado de inimigos. Entre as hostes republicanas começa a ganhar adeptos a via revolucionária para a tomada do poder e um núcleo radical é incumbido no Congresso do Partido Republicano de "auxiliar ou fazer revolução" (Abril, 1908).

Na noite de 3 para 4 de Outubro de 1910 uma variedade de forças militares e paramilitares arregimentadas pelos republicanos vão sublevar-se contra a monarquia e no dia 5 pelas nove horas é proclamada a República a partir da varanda da Câmara Municipal de Lisboa. No rescaldo da revolta o rei deposto e a família real vão embarcar na Ericeira rumo ao exílio em Inglaterra. Culminava assim o processo iniciado durante o século XIX que punha agora fim à monarquia constitucional vigente desde 1820 e fundava a Primeira República Portuguesa.


Fontes Bibliográficas:
MATTOSO, José (dir.), RAMOS, Rui (coord.) (2001). História de Portugal (VI Volume) - A Segunda Fundação, pp. 322-347. Editorial Estampa.
RAMOS, Rui (coord.), VASCONCELOS E SOUSA, Bernardo; MONTEIRO, Nuno Gonçalo (2009). História de Portugal, 7ª Edição, pp. 577-604. A Esfera dos Livros (2012). 
MARTINS, Fernando, “O 5 de Outubro: Anatomia, Natureza e Significado de uma Revolução” in Luciano Amaral (org.), Outubro: A Revolução Republicana em Portugal (1910-1926)pp. 93-115. Edições 70 (2011).

LAC

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