José de Almada Negreiros nasceu em São Tomé e Princípe em 1893, morrendo em Lisboa em 1970. Ficou para a História como talvez o artista mais versátil e polifacetado do século XX português, empregando quase todas as formas para expressar a sua arte entre pintura, desenho, dramaturgia, romances e poesia, sendo considerado um artista total.
José Sobral de Almada Negreiros nasce a 7 de Abril de 1893 na ilha de São Tomé, filho de António Lobo de Almada Negreiros, um funcionário colonial, e Elvira Sobral, uma mestiça com fortuna familiar. Fica orfão de mãe com apenas três anos e o seu pai parte para Paris onde voltaria a casar. Em 1900 ingressa, em regime de internato, no Colégio dos Jesuítas de Campolide, actual Colégio Almada Negreiros da Universidade Nova de Lisboa. Apesar do turbulento início de vida, em 1905, com apenas 12 anos, já escreve e desenha os jornais manuscritos "O Progresso", "A República", "O Mundo" e "A Pátria".
Com a Instauração da República em 1910, o colégio religioso que frequentava é extinto deslocando-se para estudar no Liceu de Coimbra. No ano seguinte já está de volta a Lisboa e ingressa na Escola Internacional da Rua da Emenda. É tido como um artista essencialmente auto-didacta, não tendo frequentado qualquer ensino artístico. Em 1911 estreia-se como desenhador humorista na revista "A Sátira", atividade que prossegue noutros periódicos entre 1912 e 1913. Participa no I e II Salões dos Humoristas Portugueses, no Grémio Literário de Lisboa.
Em 1913, na revista "A Águia", Fernando Pessoa dedica uma crítica às caricaturas que o jovem Almada apresentara numa primeira exposição individual em que o considera "interessado de várias maneiras na futilidade da vida" e atesta já "o polimorfismo da sua arte" e a sua "personalidade e originalidade"; "Almada Negreiros não é um génio - manifesta-se em não se manifestar."
Em 1914 publica o primeiro poema e em 1915 associa-se à primeira vanguarda modernista, ao lado de Fernando Pessoa ou Mário Sá Carneiro, integrando o número 1 da revista "Orpheu" com o texto "Frizos". Escreve, em 1915, "A Cena do Ódio", uma insurreição poética contra os valores e intelectualidade vigentes, que dedica a Álvaro de Campos. Fernando Pessoa, revê a sua opinião e considera que Almada Negreiros "está actualmente homem de génio em absoluto, uma das grandes sensibilidades da literatura moderna".
No ano seguinte, escreverá o "Manifesto Anti-Dantas e por Extenso", uma reacção contra a peça Soror Mariana Alcoforado de Júlio Dantas, causando escândalo entre a burguesia lisboeta conservadora da época. No manifesto poético, Almada ataca virulentamente Júlio Dantes e os seus supostos discípulos:
"BASTA PUM BASTA! UMA GERAÇÃO, QUE CONSENTE DEIXAR-SE REPRESENTAR POR UM DANTAS É UMA GERAÇÃO QUE NUNCA O FOI! É UM COIO D'INDIGENTES, D'INDIGNOS E DE CEGOS! É UMA RÊSMA DE CHARLATÃES E DE VENDIDOS, E SÓ PODE PARIR ABAIXO DE ZERO! ABAIXO A GERAÇÃO! MORRA O DANTAS, MORRA! PIM!"
Em 1917, organiza com Santa-Rita Pintor a 1ª Conferência Futurista, que decorre no Teatro República, e lança a revista de número único "Portugal Futurista", assumindo em pleno o rótulo de "futurista" em provocação às gerações anteriores que considera antiquadas e passadistas. Em "Portugal Futurista" são lançados os textos "Mima Fatáxa" e "Saltimbancos", hoje vistos como paradigmáticos do futurismo em Portugal. Este estilo caótico e compacto já tinha sido exibido por Almada na obra "K4 O Quadrado Azul", em colaboração com o pintor Amadeo de Souza-Cardoso, que também se associou à publicação da revista.
É por volta desta época que assiste em Lisboa às representações dos Ballets Russes, que o marcam profundamente. No seguimentes destes espectáculos, organiza uma série de bailados nos quais participa enquanto coreógrafo, dançarino cenógrafo e figurinista. Em princípios de 1919 parte, finalmente, para Paris, onde subsiste inicialmente com dificuldade, aceitando trabalho como bailarino de salão e empregado de armázem. Convive com Max Jacob, Picasso, Brancusi, entre outros modernistas. Dedica-se intensamente ao desenho, agora caracterizado pela "estilização expressiva e distanciada da realidade".
A breve passagem por Paris dura menos de um ano e meio e em Abril de 1920 está de volta a Lisboa. Numa exposição no Teatro de São Carlos, mostra o trabalho produzido na capital francesa e anuncia o manifesto poético "A Invenção do Dia Claro". Durante os anos 20 lança a obra "Pierrot e Arlequim" (1924) e escreve "Nome de Guerra" (1925); colabora nas publicações "Contemporânea" de José Pacheco, na "Athena" de Fernando Pessoa e no "Diário de Lisboa"; participa na Exposição dos Cinco Independentes (1923) e nos I e II Salões de Outono (1925 e 1926).
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| Auto-Retrato num grupo, para o Café "A Brasileira" (1925) |
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| Nu, para o Bristol Club (1926) |
Em 1927, despede-se novamente de Lisboa, desta vez rumo a Madrid. Ao contrário do que sucedera na breve passagem por Paris, Almada envolve-se activamente na vida cultural da capital espanhola onde permanece durante cinco anos. Participa nas tertúlias do café Pombo, sob a égide do escritor vanguardista Ramón Gómez de la Serna, com quem colabora na ilustração de dezenas de textos e como cenógrafo da peça "Los Medios Seres". O seu trabalho como ilustrador neste período pode ser traçado em diversas publicações espanholas. A nível expositivo são de destacar a mostras no âmbito da Unión Ibero-Americana (1927), das Galeries Dalmau de Barcelona (1927) e da Exposición de Pintura y Escultura Moderna de San Sebastián (1931). Em terras espanholas escreve "El Uno - Tragedia de la unidad" e "Deseja-se Mulher".
"Queremos a colectividade portuguesa à altura de si própria, vista de todos os lados da terra. Que cada português, dentro ou fora da nossa terra seja o perfeito indivíduo da nossa própria colectividade. Estamos todos incondicionalmente ao lado da colectividade portuguesa passo a passo, egoistamente, como quem sabe exactamente o sítio onde está a sua própria vida de indivíduo português."
Em 1935, Almada recusa-se a participar na I Exposição Oficial de Arte Moderna, organizada pelo director do Secretariado de Propaganda Nacional António Ferro, e apresenta a conferência "Os Artistas Raridades de Excepção e Outras Palavras Alto e Bom Som". No final do mesmo ano morre Fernando Pessoa, deixando Almada como o último sobrevivente da Geração Orpheu. Publica "Fernando Pessoa, o Poeta Português" e dedica-lhe uma "Ode a Fernando Pessoa". Em 1954 pintaria um Retrato de Fernando Pessoa para o restaurante Irmãos Unidas, que dez anos mais tarde replicaria para a coleção da Fundação Calouste Gulbenkian.
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| Retrato de Fernando Pessoa com a revista Orpheu nº 2 (1964) |
Entretanto, daria alguma estabilidade emocional à sua vida através do casamento com a também pintora Sarah Affonso, e também financeiras, virtude sobretudo das encomendas públicas que se tornam recorrentes. Cumula prémios e distinções como o Prémio Columbano em 1942, o Prémio Domingos Sequeira em 1946 ou o Prémio do Diário de Notícias - Artes Plásticas em 1966.
Em 1945 é convidado pelo arquitecto Porfírio Pardal Monteiro, com quem já tinha trabalhado na Igreja de Nossa Senhora de Fátima, para produzir os painéis decorativos das Gares Marítimas de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos. Almada Negreiros diria mais tarde que acreditava nunca antes ter feito melhor ou obra que fosse mais sua. No entanto, o mesmo entusiasmo não foi demonstrado pelos encomendadores, nomeadamente pelos painéis de índole neo-realista, que estiveram mesmo em risco de serem pintados por cima, o que não aconteceu devido à intervenção de João Couto, director do Museu Nacional de Arte Antiga.
| Painel do tríptico "Quem não viu Lisboa não viu coisa boa" |
Eduardo Lourenço assim o descreve:
"Estranho arco de vida e arte o que une Almada «Futurista e tudo», Narciso do Egipto da provocante juventude, ao mago hermético certo de ter encontrado nos anos 40, «a chave» de si e do mundo no «número imanente do universo»"
Morre a 15 de Junho de 1970 no Hospital de São Luís dos Franceses, o mesmo onde morrera Fernando Pessoa.


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