sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

SÃO NICOLAU E A ORIGEM DO PAI NATAL

Na tradição cristã, São Nicolau de Mira (270-343) ou de Bari foi um bispo de ascendência grega da cidade de Mira, na atual Turquia, durante o Império Romano, que realizou inúmeros milagres durante a sua vida, assim como obras de caridade e viagens de peregrinação pelo Egipto, Palestina e Jerusalém.


São Nicolau por Jaroslav Čermák (1831-1878)



São Nicolau é reconhecido pela sua reputação de atribuir presentes secretos e por ser um dos primeiros santos cristãos, tendo comparecido no Primeiro Concílio de Niceia (325) como defensor do Trinitarismo, em oposição ao Arianismo, que negava o conceito de Santíssima Trindade e separação das três entidades da Trindade. No entanto, a sua presença no Concílio é disputada devido a registos históricos contraditórios. Existe ainda uma lenda que surgiu já no século XIV (mais de mil anos após a sua morte) que descreve que S. Nicolau, ao ter perdido a paciência com um dos defensores do Arianismo, o terá esbofeteado, levando a que o imperador Constantino revogasse o seu pálio (manto destinado aos arcebispos) e mitra. Versões mais tardias identificam o opositor como o próprio Ário (256-336), fundador da doutrina arianista, e a agressão terá levado a que S. Nicolau fosse preso e mais tarde libertado por Cristo e pela Virgem Maria, sendo que a última que lhe terá oferecido um omofório para que Nicolau se pudesse voltar a apresentar como bispo.


Representação de S. Nicolau no Concílio de Niceia num ícone grego medieval


Em termos de iconografia, São Nicolau de Mira é representado como um idoso de barba branca com vestes de bispo ortodoxo, mais particularmente o omofório e a mitra, a segurar três esferas de ouro para dar em segredo a um homem pobre como dote para as suas três filhas. Contudo, a natureza dos três dotes varia de acordo com a representação, sendo que nalguns casos as esferas douradas seriam interpretadas como laranjas, sobretudo nos Países Baixos, que acreditavam que o santo viveria em Espanha e realizava visitas anuais para trazer laranjas e outras frutas invernais (dado que a proveniência da maioria das laranjas na Europa vinha da Península Ibérica).
Noutras representações é retratado com Jesus Cristo sobre o seu ombro esquerdo segurando o livro dos Evangelhos, e a Virgem Maria no seu ombro direito, com um omofório, concordante com a lenda do seu aprisionamento no Concílio de Niceia. Nas representações de São Nicolau de Bari este apresenta pele escura, enfatizando a sua origem estrangeira. 


Pormenor da antífona "São Nicolau" (final do séc. XIII), por Mestre de Girona


A sua generosidade e múltiplos milagres permitiram consolidar o seu culto e veneração como padroeiro e protector dos marinheiros, crianças, arqueiros, ladrões arrependidos, estudantes, cervejeiros, entre outros, pelo que é também representado rodeado de navios, crianças ou de outros elementos associados aos seus milagres. Entre os vários relatos da sua hagiografia constam: salvar três indivíduos inocentes da execução, empurrando a espada do carrasco para o chão; ressuscitar três crianças que haviam sido mortas e conservadas num barril por um açougueiro durante uma fome, ao fazer o sinal da cruz; acalmar uma tempestade na qual o seu navio se encontrava durante a sua viagem para a Terra Santa. Além disso, a tradição aponta que, após a morte dos seus pais, S. Nicolau terá doado toda a sua riqueza para os pobres, como uma das suas obras de misericórdia mais célebres.


"São Nicolau Salva Três Inocentes da Morte" (1888), por Ilya Repin


O conceito contemporâneo de Pai Natal evoluiu a partir da tradição de celebração de São Nicolau nos Países Baixos, "Sinterklaas", a 6 de Dezembro, onde há um culto em redor do santo como padroeiro das crianças, com a reputação de colocar moedas nos sapatos. A emigração dos neerlandeses para o Novo Mundo, nomeadamente para Nova Amesterdão (que se tornaria posteriormente Nova Iorque) no século XVII levou à expansão da tradição. Como tal, há o recurso a elementos da história e lenda de S. Nicolau, nomeadamente a sua bondade e generosidade, misturado ainda com a figura do "Father Christmas", uma personificação de origem inglesa do próprio Natal, com origens no século XV. As colónias inglesas na América do Norte permitiram também sedimentar a figura do Pai Natal e o hábito de troca de prendas no Natal, uma tradição que perdura até aos dias de hoje.



Beatriz Fonseca Fernandes

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