quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

OS "POVOS DO MAR" E O COLAPSO DAS CIVILIZAÇÕES DA IDADE DO BRONZE


Os Povos do Mar foram uma confederação de ferozes tribos guerreiras, que durante a etapa final da Idade do Bronze semearam o caos nas costas do Mediterrâneo através de sucessivas incursões depredatórias. A sua passagem foi de tal modo devastadora que a maioria dos registos acerca da sua origem e da sua cultura foram perdidos, permanecendo até hoje como um dos maiores mistérios da História.

Contam-se provavelmente entre os numerosos povos forçados à migração devido às alterações climáticas que se verificaram nesta época, que acompanharam secas, fomes e catástrofes naturais. São frequentemente apontados como uma das principais razões para o colapso das grandes civilizações da Idade do Bronze, sendo incontestável o seu papel na destruição dos poderosos Hititas.


Egípcios travam batalha naval contra os Povos do Mar, representado no Templo de Medinet Habu

Foram o cavalo vermelho para o Apocalipse do final da Idade do Bronze, narrado de forma mítica na Ilíada de Homero ou no Livro Bíblico de Josué. Esta crise sem precedentes mergulhou o mundo na sua primeira Idade das Trevas, com a queda das principais civilizações da Antiguidade, resultando, por exemplo, no esquecimento da escrita ou das técnicas de arquitectura monumental dos antigos gregos. A descrição dos Povos do Mar chega-nos principalmente de crónicas dos egípcios que os evocam da seguinte forma:

"Vieram do mar nos seus vasos de guerra e eram invencíveis em batalha"

Esta é uma descrição típica por parte dos egípcios que travaram pelo menos duas grandes guerras contra estes povos: a primeira durante o quinto ano do reinado de Merneptah (1236-1223 a. C.) e a segunda durante o oitavo ano do reinado de Ramsés III (c. 1198-1166 a. C.).

Porém nenhuma inscrição da Antiguidade os refere como "Povos do Mar". Esta expressão foi popularizada pelo egiptólogo francês Gaston Maspero em finais do século XIX. A sua menção é quase sempre acompanhada por referências do mar donde estes vinham e por vezes é sugerido que teriam tido origem insular. As crónicas do faraó Ramsés III chegam mesmo a nomear as tribos que formavam esta coligação e vários historiadores têm vindo a conjecturar correspondências para estes léxicos em localizações que conhecemos:



Os filisteus são destas hipóteses a que reúne maior consenso e plausibilidade histórica. Supõe-se que os filisteus fossem de facto povos insulares, sendo originários da ilha de Creta. Do mesmo modo, podiam possuir os conhecimentos de náutica e construção de navios exibidos pelas culturas micénicas. Os filisteus fixar-se-iam mais tarde numa das áreas mais flageladas pelas incursões dos Povos do Mar: os territórios dos canaanitas no Levante. A proveniência das restantes tribos que constituíam esta confederação permanecem incertas.


Subjugação dos Povos do Mar por Ramsés III. Gravura no Templo de Medinet Habu (Foto de Ferrel Jenkins)
 

Aquando da sua segunda incursão em território egípcio, as hordas dos Povos do Mar são desbaratas por forças comandadas por Ramsés III. Na subsequente Batalha do Delta, os exímios arqueiros egípcios alinharam-se nas margens do Nilo de forma a alvejar repetidamente os navios da coligação, afundando grande parte da sua frota. A Batalha do Delta marca o fim das invasões dos Povos do Mar que saem da História exactamente como entraram. Esta foi no entanto uma vitória de Pirro para os egípcios que saíram deste confronto irreversivelmente enfraquecidos e nunca mais voltariam a atingir o mesmo patamar de poder. A destruição dos Povos do Mar é mencionada pelo faraó Ramsés nos seus registos:


"Quanto àqueles que trespassaram as minhas fronteiras, a sua semente não mais brotará. Os seus corações e as suas almas estão finados para toda a eternidade"

Ao serem sacudidos definitivamente, os Povos do Mar cairiam no esquecimento, permanecendo no ar, eternamente e apenas, o grande mistério arqueológico desta civilização sem origem conhecida. O balanço final da sua interferência foi a interrupção de um verdadeiro ciclo de globalização e prosperidade partilhado pelas civilizações egeias. A sua passagem causou directa, através da destruição e da pilhagem, ou indirectamente, através da perturbação das rotas comercias, a queda de algumas das mais poderosas civilizações desta Era, como os Hititas, Micénicos ou Minoicos.


Bibliografia:
CLINE, Eric; 1177 B. C., The Year Civilization Collapsed; Princeton University Press, 2015.
https://www.britannica.com/topic/Sea-People
https://www.ancient.eu/Sea_Peoples/


LAC

1 comentário:

  1. MUITO INTERESSANTE. SÃO TEXTOS E IMAGENS INÉDITOS QUE NOS SURPREENDEM. PARABÉNS. CONTINUE, SEM SE ESQUECER QUE, EM PRIMEIRO LUGAR, VEM O TERMINUS DO CURSO. ABRAÇO

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