segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

A GUERRA DE TODOS CONTRA A RÚSSIA


A Guerra da Crimeia foi um conflito decorrido de 1853 a 1856 que opôs a Rússia Imperial a uma coligação entre a Grã-Bretanha, a França e o Império Otomano. É melhor compreendida no contexto da "Questão Oriental", no qual as potências europeias temem as repercussões do iminente colapso do Império Otomano e as mudanças do equilíbrio de poderes na região. As justificativas para a guerra mais evocadas são no entanto de cariz religioso. A Rússia age contra os otomanos como "protectora" dos súbditos cristãos ortodoxos do sultão. Russos (ortodoxos) e franceses (católicos) disputavam direitos sobre locais de culto na Terra Santa. O certo é que, quando a frota russa do Mar Negro afunda uma esquadra turca em Sinope, França e Inglaterra interferem e declaram guerra à Rússia.


Soldados do Regimento 72 Highlanders (Joseph Cundall e Robert Howlett, 1854-56)

Porquanto as motivações da França de Napoleão III se relacionavam mais com a recuperação do prestígio internacional perdido, para a Inglaterra o expansionismo russo representava uma ameaça bem real. O Império Britânico atingia na altura o apogeu do seu poder e extensão, não encontrando rival em parte alguma do globo: apenas a constituição de um império euroasiático pela Rússia poderia ameaçar essa hegemonia.

O choque de interesses entre ingleses e russos proveio antes de mais dos estreitos laços estratégicos e comerciais que uniam os turcos ao Império Britânico. Embora em franca decadência enquanto unidade política, o Império Otomano agigantava-se do Norte de África ao Médio Oriente, dominando vários pontos vitais aos interesses britânicos, nomeadamente os acessos à Índia.


Em Setembro de 1854 a frente anglo-francesa desembarca 50 mil homens na península da Crimeia. As forças aliadas esperavam realizar uma marcha triunfal até à cidade portuária de Sebastopol, a mais importante da Crimeia e a base da frota russa do Mar Negro. Porém um percurso de 50 quilómetros prolongou-se durante mais de um ano, sendo cada palmo de terra ferozmente disputado em sucessivas batalhas e escaramuças.


Entre as dezenas de confrontos existiram três batalhas que se destacaram: Alma (Setembro 1854), Balaclava (Outubro 1854) e Inkerman (Novembro 1854). Enquanto numa fase inicial nas margens do rio Alma as tropas aliadas varreram um contingente russo tecnologicamente despreparado para as realidades da guerra moderna, os restantes encontros foram caracterizados por uma sanguinolência desnecessária e por falhas de comando que custaram a vida a muitos homens. É notório o caso que teve lugar em Balaclava, imortalizado no poema de Lord Alfred Tennyson Charge of the Light Brigade:


"Forward, the Light Brigade!"

Was there a man dismayed?

Not though the soldier knew

Someone had blundered.

Theirs not to make reply,

Theirs not to reason why,
Theirs but to do and die.
Into the valley of Death
Rode the six hundred.   


Valley of the Shadow of Death (Roger Fenton, 1855) - O nascimento da fotografia de guerra

Após a queda do bastião de Malakhov, capturado por tropas francesas, os russos bateram em retirada para defender o último reduto. Finalmente em Setembro de 1855 as forças aliadas alcançavam Sebastopol. A incapacidade de selar hermeticamente a cidade permitiu no entanto que os russos destruíssem as suas infraestruturas e evacuassem as suas forças para o Mar Negro.

Sem mais capacidade para sustentar uma guerra que se advinhava perdida e potencialmente agravada  pela adesão dos Austríacos à aliança inimiga, os russos sentam-se à mesa para negociar a paz que será formalizada no Tratado de Paris em Março de 1856. Todos os territórios capturados durante a guerra foram restituídos ao Império Otomano e a Rússia perdeu posses na Bessarábia para a Moldávia. O rio Danúbio foi aberto ao comércio de outras nações e o Mar Negro foi neutralizado militarmente.    

Embora muitas vezes esquecida a Guerra da Crimeia foi à luz de muitos aspectos a primeira guerra moderna. Foi o primeiro conflito com recurso a caminhos de ferro, comunicação por telégrafo, barcos a vapor e armas de fogo nunca antes vistas. Foi a primeira guerra a ser documentada através da objectiva da câmara fotográfica, por fotógrafos pioneiros como Carol Szathmari ou Roger Fenton.

Também se destacou por uma desproporcionada mortandade totalizando 750 mil mortos em pouco mais de dois anos, fazendo antever os horrores das guerras do século XX. Uma parte significativa destas perdas foi causada pela doença e pelas condições deploráveis a que estes homens foram submetidos. Esta crise humanitária despertou na época a solidariedade de enfermeiras que acorreram aos soldados, como a jamaicana Mary Seacole ou a britânica Florence Nightingale, esta última revolucionando o tratamento de feridos de guerra.


https://www.britannica.com/event/Crimean-War

http://www.history.com/topics/british-history/crimean-war LAC

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